Notas complementares ao documentário "Dívida pública brasileira - a soberania na corda bamba"16/4/2018 Nota 1 - No minuto 13 do vídeo, o entrevistado João Pedro Stédile diz que os beneficiários da dívida pública seriam somente 15 mil famílias. Atualmente, existem também os chamados “Fundos de Investimento” e “Fundos de Pensão”, que são bastante citados pelos analistas neoliberais como sendo uma prova de que a dívida beneficia milhões de pessoas. No caso dos Fundos de Investimento, as pessoas podem aplicar suas economias em “fundos de renda fixa” em qualquer banco, que por sua vez aplica o dinheiro dessas pessoas em títulos da dívida interna. Porém, quando analisamos a distribuição dos tipos de detentores de títulos da dívida interna federal, verifica-se que os bancos, investidores estrangeiros e as seguradoras (que possuem grande ligação com bancos) já respondem pela maioria do estoque da dívida “interna”. No caso dos Fundos de Investimento, que apenas respondem por 21% da dívida interna, quando foi solicitado ao governo, por meio da “Lei de Transparência”, os nomes dos seus beneficiários (e o valor detido por cada um), o governo se negou a responder, impedindo que saibamos a verdadeira distribuição dos títulos entre a chamada “classe média” e grandes investidores. No caso dos Fundos de Pensão (“Entidades Fechadas de Previdência”), onde geralmente trabalhadores contribuem para posteriormente, em tese, receber suas aposentadorias, o governo também não divulga qual o montante da dívida detido por eles. O Tesouro Nacional apenas divulga um valor denominado “Previdência” (que responde por 19% da dívida interna federal, conforme se vê no gráfico), que soma os Fundos de Pensão com a chamada “Previdência Aberta”, ou seja, onde qualquer pessoa – inclusive milionários e banqueiros - pode colocar suas economias. Por sua vez, o Banco Central divulga o montante da dívida interna federal detido pelos Fundos de Pensão, mas apenas a parte investida em títulos da dívida por meio de Fundos de Investimento, sem informar o montante de títulos da dívida comprados diretamente. A única forma de tentar estimar a participação dos Fundos de Pensão na dívida interna federal é por meio do “Informativo Mensal da Subsecretaria do Regime de Previdência Complementar”, onde se diz que os Fundos de Pensão aplicavam (em novembro de 2017) R$ 430,2 bilhões em investimentos de “Renda Fixa”, dentro dos quais se incluem títulos da dívida interna federal. Porém, não há detalhamento de qual montante destes R$ 430,2 bilhões estão aplicados em tais títulos. Portanto, apenas podemos dizer que os Fundos de Pensão respondem por bem menos que 10% da dívida interna federal, que já ultrapassa R$ 5 trilhões. Alguns analistas neoliberais também dizem que o chamado “Tesouro Direto” seria uma prova de que cerca de 2 milhões de pessoas podem investir na dívida pública. Porém, conforme se verifica na página do Tesouro Nacional, o montante da dívida detida no “Tesouro Direto” não chega a 1% do total da dívida interna federal. Portanto, tal discurso – de enfatizar a figura dos fundos de investimento, pensão e Tesouro Direto – faz parte de uma estratégia de legitimação da dívida pública, tentando passar a ideia de que a dívida beneficia todos os brasileiros, quando na realidade beneficia principalmente grandes bancos e investidores. Nota 2 - Também no minuto 13 do vídeo, o entrevistado João Pedro Stédite cita o gráfico de pizza da Auditoria Cidadã da Dívida, citando o percentual “dos impostos” que vai para o pagamento da dívida. Na realidade, o gráfico de pizza inclui todas as receitas do orçamento, que não se limitam aos impostos, mas também, por exemplo, as contribuições (como a do INSS, COFINS, PIS, etc), os lucros das estatais e do Banco Central (que, infelizmente, por lei são direcionados ao pagamento da dívida pública), e as receitas com novos empréstimos. Muitos blogs de ultra-direita tem criticado o gráfico da auditoria cidadã alegando que não se deveria contabilizar os gastos que são financiados com novos empréstimos, porém, tais gastos devem sim ser contabilizados, pois poderiam - e deveriam - estar sendo destinados para investimentos sociais (por exemplo, transporte público, melhoria dos hospitais, escolas, universidades, estradas, etc), e não principalmente para pagar juros , como ocorre atualmente. Quando o governo escolhe tomar empréstimos para pagar juros, ele está sim fazendo uma escolha política e obviamente gastando recursos públicos, ou seja, ele poderia destinar tais recursos para investimentos sociais, que gerariam retorno em termos econômicos (geração de emprego, na arrecadação tributária, etc) e gerando, assim, a capacidade de pagamento desta dívida. Por outro lado, tomar empréstimos para pagar juros só serve para concentrar ainda mais a riqueza e a renda no país. Nota 3 – Muitos entrevistados falam do chamado “Superávit Primário”, ou seja, em termos simples, a diferença entre a arrecadação tributária do governo e os gastos sociais. Na época em que ocorreram as entrevistas, havia superávit primário, ou seja, a arrecadação tributária era maior que o gasto social, sendo que tal sobra de recursos era reservada para o pagamento da dívida. De 1995 a 2015,houve um “superávit primário” acumulado de R$ 1 trilhão, e mesmo assim a dívida interna federal explodiu, de R$ 86 bilhões para 4 trilhões. O que prova que essa dívida nada tem a ver com um suposto excesso de gastos sociais (por exemplo, previdência, servidores públicos, etc), mas sim, com altíssimas taxas de juros e outros artifícios financeiros sem benefício para a população. Nos últimos anos, com a manutenção de uma política de juros altíssimos, a economia entrou em profunda recessão, fazendo cair fortemente a arrecadação tributária, gerando um déficit primário. Porém, isso não altera a priorização dos gastos com a dívida pública, pois o governo passa a tomar mais empréstimos para pagar os juros e amortizações da dívida.
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SOBRE O BLOG...O movimento da Auditoria Cidadã da Dívida agora conta com este espaço, desenvolvido para dialogar com você que está em busca de novos caminhos e linguagens que descompliquem o tema da dívida pública na sua cabeça. Este blog é uma iniciativa do núcleo baiano da Auditoria Cidadã da Dívida para uma educação econômica e emancipadora da população brasileira. O núcleo identificou, após algumas atividades de formação com grupos sociais diversos, a importância de se construir um espaço para dialogar com principiantes no assunto. O propósito deste blog é tornar mais acessível esse tema que muitas vezes parece um “bicho de sete cabeças”. Se você já acessa o conteúdo informativo da página da Auditoria Cidadã da Dívida, contará a partir de agora com o blog “Descomplicando a dívida pública”, uma ferramenta que reunirá conhecimentos sobre a dívida pública a partir de outras linguagens – como aquela que é própria dos filmes/documentários –, com textos e informações compreensíveis. Construiremos coletivamente este blog trilhando os caminhos da popularização do conhecimento. Esperamos que este seja mais um instrumento de formação crítica na luta contra o sistema da dívida que também tenta se impor por meio de uma linguagem complexa, servindo exclusivamente para afastar as pessoas desse tema que é decisivo para a garantia dos nossos direitos básicos como saúde, educação e habitação. |